sábado, 16 de outubro de 2010

Sobre Jin (Seoul, 16 de outubro de 2010 - 01h00)

Jim é dono de um bar... Pai de família abandonado pela esposa há uns 10 anos, criou seus 3 filhos (2 meninos e 1 menina) com o dinheiro que ganhou trabalhando com roupas para mulheres. Após algum tempo, por algum motivo desta vida, perdeu boa parte do dinheiro e decidiu abrir o tal bar. O bar se chama "Iron Blue" e por uma destas brincadeiras do acaso, foi encontrado por meu amigo americano, Tim, em seu primeito dia em Seoul. O Iron Blue é um ótimo bar, com boa cerveja (mais encorpada e saborosa que a dos outros bares, mas com um valor um pouco maior) e boa música - é o único lugar em Seoul que você pode ouvir desde Michael Jackson e Eagles até Buena Vista Social Club e Beatles.


The Iron Blue - o nome é em alusão a uma mulher que é forte, mas não perde a ternura, segundo Jim

Por algum traço de sua personalidade, Jim gostou muito de mim, Tim (americano), Martin (sueco) e de Lun (chinês de Hong Kong). De um modo recíproco, também gostamos dele... Desse sentimento mútuo surgiu um respeito grande e uma confiança. Posso dizer que Jim, com seus 50 anos, é meu melhor amigo coreano. Quando vamos lá, ele nos oferece snacks e arranha conversas em inglês, sempre se esforçando para nos entender. É sempre curioso para descobrir características de nossos países e nos chama de "gentleman" pelo nosso gosto musical e por conversarmos com ele, ao contrário de outros clientes.

Numa de nossas conversas, Jim estava muito triste e nos confidenciou que estava com sérios problemas financeiros. Natural de Busan (há quase 3 horas de trem de Seoul), Jim tinha problemas para manter os 3 filhos sozinho, já que o bar não ia muito bem das pernas - notamos isso por sermos quase sempre os únicos clientes. Mesmo assim, ele nos convidou para sua festa de aniversário, no próprio bar... Acho que nunca o vimos tão feliz ao nos receber e nos sentimos realmente importantes para alguém por aqui - inclusive, ele nos presenteou com algumas coisas. Mas, tarde da noite, depois de vários shots de tequila, ele voltou a nos contar que não estava bem.

Assim, decidimos fazer algo e começamos a convidar todas as pessoas que conheciamos na faculdade para ir lá. Organizamos uma festa, na qual eu e Florian (alemão) e Tim o ajudamos no bar preparando coquetéis, enquanto as meninas ajudaram a limpar as mesas e a servir as bebidas. Foi fantástico, vendemos quase todo o bar e ele conseguiu levantar um bom dinheiro. Achava que as coisas iam começar a melhorar pra ele, pois seu grande desejo é juntar uma grana pra voltar a viver em Busan com o resto da sua família.


Min-Ji, Florin, Tim, Eu e Jim, na festa de aniversário de Mikko, quando arrecadamos uma boa grana

Mas as coisas não são assim tão simples nesta sociedade em que vivemos. Certamente traumatizado com a partida da esposa, Jim começou a beber mais do que seu limite nesta época. Infelizmente, o hábito persiste até hoje. Não conseguindo se livrar do vício, Jim gasta boa parte do dinheiro que recebe em Soju (uma barata bebida tradicional coreana) e está sempre bêbado quando chegamos ao bar.

Hoje, voltei lá depois de mais de 10 dias sem ir, pois a semana não foi das melhores por aqui. Provas, trabalhos, saudades do Brasil... Enfim, vários motivos me fizeram passar um bom tempo em casa sozinho ao invés de sair. Jim estava triste comigo, mas não havia nada que eu pudesse fazer, espero que ele tenha entendido quando lhe expliquei. Bêbado novamente, ele me convidou para beber Soju com ele assim que o bar fechasse. Não sei se fiz a coisa certa, mas não pude aceitar. Acredito que ele deve ter ficado sentido, mas não pude aceitar... Estou com esta dúvida na cabeça até agora. Será que fiz a coisa certa?

A lição que tiro de toda essa história, que ainda não acabou, é a mesma que venho constatando a um bom tempo. Jim é apenas um exemplo de milhares de outras pessoas que passam pelas mesmas situações. Sem dinheiro, não conseguem nunca se recuperar da sua condição. Sem suporte algum e sem auto-estima, não acreditam que podem melhorar e acabam buscando as soluções em álcool e cigarro, gastando ainda mais o pouco dinheiro que tem. E o ciclo vicioso continua, sem que a sociedade, governo, ninguém dê a mínima, afinal, é assim que o mundo é, certo? Uns ganham, outros perdem, é a lógica do sistema, o que se pode fazer?

Desculpem-me, mas não consigo e não posso aceitar que isto seja a ordem natural das coisas. Isso é errado, e tem que mudar... De algum modo e em algum momento, mas deve.

´Também peço desculpas pelo post, mas sinto como desabafando os sentimento. O lado positivo é que essa vivência nos faz pensar demais - e o lado negativo é que essa vivência nos faz pensar demais...

Um comentário:

  1. A pessoa só muda se começar a pensar nas outras com quem convive...vc querer enfiar sua vida na lata do lixo é uma coisa, agora quando isso afeta quem está ao seu redor,família ou não, e querer levar eles pro mesmo lugar é burrice e egoísmo!!!
    Vc pode ajudar ela a dar o primeiro passo, mas ela tem que aprender a andar por si só, se não for por ela, que seja pelas pessoas que ela ama!!
    Um vício vc cura; a dor de uma perda vc supera com o tempo....mas para isso acontecer vc tem que querer!!!
    Vc mostra a luz no fim do túnel, mas ela segue se quer!!! Isso é o livre arbítrio!!!Vc faz o seu destino.
    Nem tudo é perfeito.... isso é a vida!!!

    1 de novembro de 2010 07:23

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